Podemos concluir que a acção dramática se manifesta por uma crítica profunda
ao que, na forma aparente da peça, se exprime para exaltar os desígnios militares de
Cruzada do Papa Leão X que, desde a sua posse apresenta o exemplo de Portugal (no
Oriente) à Europa, para promover a sua guerra pela fé contra os Turcos. Assim, é ele
quem dirige – na figura do Clérigo nigromante português, – mas a Portugal interessa
o avanço e a consolidação das conquistas no norte de África, como uma forma de
segurança para a navegação na costa ocidental e, com o pretexto da defesa do comércio
marítimo destaca-se o objectivo de domínio em proveito das forças económicas
dominantes no país, mais ao serviço dos banqueiros (mercadores) da Alemanha – dos
Welser e dos Fugger – do que da Nação. Todavia, com o beneplácito da Igreja dado pelo
Papa Leão X na sequência da Embaixada, (ou seja, em continuidade da figura da FÉ
em Fama), tudo se fará pela fé da cristandade, e daí que o autor figure na peça aquela
dupla acção: pela grandeza de Portugal e pela fé cristã. Assim, estão em conformidade
os discursos das incorporadas figuras alegóricas. Gil Vicente não está a “defender a
fé” nem sequer a “defender a guerra” ou a grandeza e glória de Portugal, pois são as
personagens que, nesta peça, em verdade, tinham de ter aqueles discursos nas suas
falas, pelo próprio mythos e pelo contexto da acção dramática, pois, o que o autor
trata na peça é o drama de Portugal – correspondendo ao drama real do país – que
se lê na acção dramática pela evocação conjugada dos dramas de Tróia e Cartago.
A figuração alegórica de Exortação da Guerra ficou pois construída pela conjunção
figurativa de Tróia com o reino de Portugal (e como Lusitânia).