Check nearby libraries
Buy this book
Last edited by brazilpublishing
August 21, 2019 | History
O livro ressalta singularidades do processo narrativo de Odete Semedo e Abdulai Sila, destacando, sobretudo, as diferentes estratégias que encenam, no corpo dos textos, questões relacionadas à identidade e à memória, elementos importantes à concretização da guineidade.
Check nearby libraries
Buy this book
Edition | Availability |
---|---|
1
A defesa incansável da esperança: feições da Guiné-Bissau na prosa de Odete Semedo e Abdulai Sila
2019, Brazil Publishing
in Portuguese
655016009X 9786550160098
|
aaaa
|
Book Details
Table of Contents
A DEFESA INCANSÁVEL DA ESPERANÇA feições da Guiné-Bissau na prosa de
Odete Semedo e Abdulai Sila
2ª edição
Editora Brazil Publishing
Conselho Editorial Internacional
Presidente:
Rodrigo Horochovski (UFPR - Brasil)
Membros do Conselho:
Anita Leocadia Prestes (Instituto Luiz Carlos Prestes - Brasil)
Claudia Maria Elisa Romero Vivas (Universidad Del Norte - Colômbia)
José Antonio González Lavaut (Universidad de La Habana - Cuba)
Ingo Wolfgang Sarlet (PUCRS - Brasil)
Milton Luiz Horn Vieira (UFSC - Brasil)
Marilia Murata (UFPR - Brasil)
Hsin-Ying Li (National Taiwan University - China)
Ruben Sílvio Varela Santos Martins (Universidade de Évora - Portugal)
Fabiana Queiroz (UFLA - Brasil)
© Editora Brazil Publishing
Presidente Executiva: Sandra Heck
Rua Padre Germano Mayer, 407
Cristo Rei ‒ Curitiba PR ‒ 80050-270
+55 (41) 3022-6005
www.aeditora.com.br
Wellington Marçal de Carvalho
A DEFESA INCANSÁVEL DA ESPERANÇA
feições da Guiné-Bissau na prosa de
odete semedo e aBdulai sila
2ª edição
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
BIBLIOTECÁRIA: MARIA ISABEL SCHIAVON KINASZ, CRB9 / 626 Carvalho, Wellington Marçal de
C331d A defesa incansável da esperança: feições da Guiné-Bissau na prosa de Odete Semedo e
Abdulai Sila / Wellington Marçal de Carvalho – Curitiba: Brazil Publishing, 2019.
324p.; 25cm (Série Estudos Africanos do CEA/UFMG, v.4) 2ª ed.
ISBN 978-65-5016-009-8
1. Literatura guineense – Crítica e interpretação. 2. Memória. 3. Semedo, Odete Costa, 1959
– Crítica e interpretação. 4. Sila, Abdulai, 1958 – Crítica e interpretação. I. Título. CDD 966.57 (22.ed)
CDU 869.0 (665.7)
Comitê Científi co da área Linguística, Letras e Artes
Presidente: Professora Doutora Denise Kluge (UFPR – Letras)
Professora Doutora Marina Andrade Câmara Dayrell (UFGRS – Artes)
Professora Doutora Teresinha Barachini (UFGRS – Artes)
Professora Doutora Luciana Marino Nascimento (UFRJ – Letras)
Professora Doutora Mariese Ribas Stankiewicz (UTFPR – Literatura)
Professora Doutora Denise Zorzetti (UFG – Música)
Professora Doutora Fernanda Pereira da Cunha (UFG – Música)
Professora Doutora Sandra Vasconcelos (UFC – Lingüística)
Editor Chefe: Sandra Heck
Diagramação e Projeto Gráfi co: Brenner Silva
Revisão de Texto: O autor
Revisão Editorial: Editora Brazil Publishing
DOI: 10.31012/978-65-5016-010-4
Curitiba / Brasil
2019
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS - UFMG
REITORA
Sandra Regina Goulart Almeida
VICE-REITOR
Alessandro Fernandes Moreira
COMITÊ COORDENADOR – CEA/UFMG (2018-2019)
Marcos Antônio Alexandre – Coordenador
Francisca Izabel Pereira Maciel (Faculdade de Educação da UFMG)
Mauro Martins Teixeira (Instituto de Ciências Biológicas da UFMG)
Uende Aparecida Figueiredo Gomes (Escola de Engenharia da UFMG)
Vanicléia Silva Santos (Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG)
CONSELHO CONSULTIVO
Amadeu Chitacumula (Instituto Superior de Educação do
Huambo, Angola)
Ana Cordeiro (Ilhéu Editora, Cabo Verde)
Odete Semedo (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa,
Guiné-Bissau)
Rafael Díaz Díaz (Pontifícia Universidad Javeriana, Colômbia)
Sônia Queiroz (Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil)
Tukufu Zuberi (University of Pennsylvania, Estados Unidos)
Vanicléia Silva Santos (Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil)
REVISÃO
Charley Worrison
SÉRIE ESTUDOS AFRICANOS
DA UFMG
O Centro de Estudos Africanos, criado oficialmente em 2012, é o primeiro centro de estudos da UFMG no âmbito do projeto de internacionalização da universidade. O CEA/UFMG tem a missão de promover a internacionalização da UFMG no continente africano, proporcionar o diálogo entre especialistas em estudos africanos da UFMG e de outros países, assim como fortalecer e divulgar as pesquisas desenvolvidas sobre o tema no âmbito da UFMG.
A Série Estudos Africanos foi criada em 2017 com o objetivo de publicar obras que envolvam redes de pesquisadores, brasileiros e estrangeiros, e que desenvolvem trabalhos com diferentes perspectivas, visando a formação de um pensamento multidisciplinar, contemplando a diversidade étnica característica de nossos povos. O foco é dar materialidade à cooperação Brasil–África que vem sendo construída pelo CEA/UFMG desde sua criação.
VOLUMES PUBLICADOS
1. VANICLÉIA SILVA SANTOS (Org.). O Marfim no Mundo Moderno: comércio, circulação, fé e status social (séc. XV-XIX). Departamento de História/PPGH/UFMG; Grupo de Pesquisa Áfricas; Editora Brazil Publishing.
2. VANICLÉIA SILVA SANTOS (Org.). Arqueologia e história da cultura material na África e na diáspora africana. CEA/UFMG, Ku Si Mon Editora e Editora Prismas.
3. VANICLÉIA SILVA SANTOS (Org.). Seminário Internacional Marfins Africanos no Espaço Atlântico: circulação, manufatura e colecionismo (séc. XVI-XIX). E-book.
4. WELLINGTON MARÇAL. A defesa incansável da esperança: feições da Guiné-Bissau na prosa de Odete Semedo e Abdulai Sila. CEA, Ku Si Mon Editora e Editora Prismas.
5. FELIPE SILVEIRA DE OLIVEIRA MALACCO. O Gâmbia no mundo Atlântico. Fulas, jalofos e mandingas no comercio global Moderno (1580 - 1630). Departamento de História/PPGH/UFMG; Grupo de Pesquisa Áfricas; Editora Brazil Publishing.
6. VANICLÉIA SILVA SANTOS (Org.). I Seminário Internacional Patrimônio, História Intelectual e Cultura na África Ocidental.
7. VANICLÉIA SILVA SANTOS, EDUARDO FRANÇA PAIVA E RENÉ LOMMEZ GOMES (Orgs.). O comércio de marfim no Mundo Atlântico: circulação e produção (séc. XV-XIX). UFMG; Grupo de Pesquisa Áfricas e Editora Brazil Publishing.
8. VANICLÉIA SILVA SANTOS, EDUARDO FRANÇA PAIVA E RENÉ LOMMEZ GOMES (Orgs.). O comércio de marfim no Mundo Atlântico: circulação e produção (séc. XV-XIX), 2ª edição - E-book. UFMG; Grupo de Pesquisa Áfricas e Editora Brazil Publishing.
9. VANICLÉIA SILVA SANTOS, LUÍS SYMANSKI E AUGUSTIN HOLL. (Orgs.). .Arqueologia e história da cultura material na África e na diáspora Africana. Departamento de História/PPGH/UFMG; Grupo de Pesquisa Áfricas; Editora Brazil Publishing; UFMG e IEAT.
10. VANICLÉIA SILVA SANTOS, LEOPOLDO AMADO, ALEXANDRE ALMEIDA MARCUSSI, TACIANA ALMEIDA GARRIDO DE RESENDE. (Orgs.). Cultura, história intelectual e patrimônio na África Ocidental (séc. XVI-XX). Departamento de História/PPGH/UFMG; Grupo de Pesquisa Áfricas; Editora Brazil Publishing UFMG.
Para meu avô materno João Evangelho Marçal (in memoriam), presença constante em meu mais profundo eu, instigando-me a resistir a qualquer possível injunção de esquecê-lo, entrego este livro-objeto-em-abismo, enlace da morte e da vida. Que subversiva mistida seria a sua, meu avô, com um gume tão afiado e
de raro alcance poético?
“Como não ver, nesse gosto pelo cotidiano no passado, o único meio de nos restituir a lentidão
dos dias e o sabor das coisas?”
(NORA, 1993, p. 20)
“Pois é doutor Wellington, pois é!”
(a palavra forte do meu avô paterno Antônio, em 2014)
AGRADECIMENTOS
Pela concretização desse sonho agradeço a Deus, Jesus Cristo, ao Espírito Santo e a minha junta de santos que não falha nunca: Nossa Senhora Sant’Ana, Nossa Senhora D’Ajuda, Santo Antônio de Roças Grandes, Nossa Senhora da Piedade, Santo Antônio, São Judas, São Jorge, Santa Luzia, Nossa Senhora Aparecida, Sagrado Coração de Jesus, São José, São Marçal, Nossa Senhora do Desterro, Irmã Benigna, São Francisco de Assis, Santo Onofre, São Longuinho, São Benedito, São Miguel Arcanjo e São Jerônimo;
À professora Nazareth, que conheci quando cheguei à PUC para cursar isoladas para entrar no Mestrado. Sou grato a Deus por ter permitido me aproximar de uma pessoa dessa sabedoria, competência, dedicação, assertividade, sensibilidade, empatia e tudo o mais de bom que possa fazer parte de um ser humano! Com ela cresci muito!!! Obrigado pela constante e inigualável orientação e amizade nesses sete anos. Não fosse ainda o bastante, ainda me brinda com “De rastros e restolhos da memória: a composição de “lugares de memória” pela literatura”, que prefacia o presente livro. O amor, a delicadeza e o gosto com que exerce o ofício de ensinar me fazem tomá-la como um exemplo que quero seguir em minha trajetória;
Este percurso foi possível porque minha mãe Imaculada, meu pai Wilson e minha tia Janita eram minha certeza de paz e fonte de sossego em todas as horas de estudo, principalmente nas que eu estava quase desesperado;
Ao meu irmão Junim, minha cunhada Fernanda e o super neném, meu sobrinho Heitor, com aquela energia boa que não esgota nunca;
À dindinha Aparecida e Dona Hilda pelas orações e incentivo;
Aos meus afilhados João Gabriel, Romária, Antônia e João Guilherme;
Aos professores da PUC: Terezinha, Márcia, Raquel, Ivete, Suely, Melânia, Audemaro e Hugo;
Aos meus amigos/irmãos do GEED: Lilian, Roberta, Lino, Luciana, Bruna, Karina, Alice, Fran, Eni, Assunção, Consuelo e Clara;
À equipe da Secretaria do Pós Letras: Berenice, Rosária, Jefferson e Giovane;
À equipe da Biblioteca da PUC, campus Coração Eucarístico, pela excelência dos serviços prestados, pela qualidade do acervo, pelo ambiente de estudos agradabilíssimo e pela bela vista da “minha” árvore do coração;
À bibliotecária e amiga Anália que divide comigo as alegrias e tristezas da gestão da Biblioteca Universitária/Sistema de Bibliotecas da UFMG, no mesmo período do trajeto deste desafiador Doutorado, não me deixando nunca desistir;
À bibliotecária Simone, minha mãe do coração, que sempre me impulsiona a combater o bom combate e na companhia de quem escrevi muito pelas estradas desse imenso Brasil;
À equipe da Biblioteca da Escola de Música da UFMG, com que trabalhei antes de assumir a Diretoria da Biblioteca Universitária: Kátia, Marilene, Valdete, Jorge, Soraia e Rachel;
Aos meus amigos Evandro, Fabiana Lugão, Rita de Cássia, Lucélia, Selminha, Graciele, Val, Elton, Rodrigo e Daniel, Sérgio Marcone, Rita Bison, Regina, Leila, Zenaide e Tudão, compadre Leandro, Pabliane e Iracy, Crizão, Gimi, Maryne e Daniel, Pedro Gandini, Arison, Sr. Márcio e Dona Cleuza;
À Ana Paula da Biblioteca do ICB; Fernanda Almeida da BU, Letícia da Biblioteca da FACE e Eliane do DPGAP, UFMG e Paula Melo da UFRJ, pela valiosa contribuição com a descoberta de material bibliográfico, como o Boletim Cultural da Guiné Portuguesa em formato digital;
Ao Maurício, Tiago Ronan, meu compadre Alan, Andréia, Gledson e Cíntia pelas alegrias sem fim;
À Ângela, Nilsinho, Álvaro, João Vicente, Salomé Pires, Márcia, Tia Ana, Má, Cláudia e Janete pelas incontáveis horas em que acompanharam minhas leituras em Lontra;
Aos meus primos Newmark, Angie Mary e Tiago;
Aos funcionários do SINDIFES pela energia positiva: Nazir, Vinícius, Sara, Adriano, Alisson e Leidiane;
Aos meus amigos e companheiros de luta na UFMG: Cristina Del Papa, Helder e Nalma, Alexandre, Reinaldo, Maria Clara, Neidinha,
Rosângela, Luíza, Emília, João de Deus, Irani Campos, Sindier, Itamar, Fernanda Lusmara;
À professora Cida Moura, da ECI/UFMG, fonte de inspiração para o redesenhar de limites e fronteiras, desde os idos de 2001;
Ao professor Jayme e à professora Sandra, Reitor e Vice-reitora da UFMG, pelo incentivo para vivenciar o doutorado, pela confiança depositada na condução da Biblioteca Universitária/Sistema de Bibliotecas e no convite para integrar a equipe do reitorado;
Às professoras Vanicléia, Sônia Queiroz e Leda Martins pela oportunidade de entrevistar pessoalmente Abdulai Sila, durante sua estada em Belo Horizonte, para participar da Jornada do Centro de Estudos Africanos da UFMG;
À professora Margarida Barreto e ao professor Roberto do Nascimento;
À professora Iris Amâncio pela corajosa militância na Nandyala;
Às professoras da Banca Examinadora da Qualificação e da Defesa da tese Carmen Tindó, Laura Padilha, Terezinha Taborda e Roberta Alves;
Ao Abdulai Sila pela desmedida generosidade na estada em BH e na preciosa entrevista concedida! “Tudo jóia!” e pela negociação para esta jornada de publicação em parceria com a Ku Si Mon;
À Odete Semedo que tive a honra de entrevistar, em março de 2017, em um por do sol em Cacheu, na Guiné-Bissau;
À Flavinha, o presente que Deus me deu como namorada, por ter sido e ainda ser um universo de paciência e tudo, tudo, tudo o que de melhor poderia acontecer nessa minha vida;
À Márcia e sua equipe da Copiadora Alternativa, na pracinha do Coração Eucarístico;
À boa energia da cantora islandesa Bjork, do malinês Toumane Diabatê e sua Kora, do artista plástico nigeriano-britânico Yinka Shonibare e do escultor australiano Ron Mueck;
À CAPES pela bolsa de estudos, modalidade PROSUP II;
Amém!!
APRESENTAÇÃO DA SÉRIE ESTUDOS AFRICANOS DO
CEA/UFMG
O Centro de Estudos Africanos, criado oficialmente em 2012, é o primeiro centro de estudos da UFMG no âmbito do projeto de internacionalização da universidade. O CEA/UFMG tem como missão promover o encontro de pesquisadores que trabalham com a África e divulgar os resultados das pesquisas desenvolvidas sobre o tema no âmbito da UFMG, em outros centros de pesquisa no Brasil e no mundo, contribuindo assim para o estabelecimento da área de pesquisa no interior de nossa instituição e para a consolidação dos estudos africanos no País.
As parcerias com universidades e outras instituições de ensino e pesquisa têm como objetivo a realização de atividades conjuntas, o intercâmbio de publicações e projetos de mobilidade acadêmica de estudantes e professores. Por meio de acordos internacionais, estudantes e pesquisadores da UFMG já puderam cursar disciplinas de sua área no exterior e alunos estrangeiros vieram à UFMG com o mesmo intuito. Nestes primeiros cinco anos de existência, o CEA também promoveu conferências e seminários em torno de temas relacionados à África, além de receber professores estrangeiros para ministrar disciplinas em nossos programas de Pós-Graduação.
A Série Estudos Africanos nasce com o objetivo de publicar obras que envolvam redes de pesquisadores, brasileiros e estrangeiros, filiados ou não a instituições de ensino superior, e que desenvolvem trabalhos com diferentes perspectivas, visando a formação de um pensamento multidisciplinar, contemplando a diversidade étnica característica de nossos povos.
Com essa nova frente de trabalho pretendemos dar materialidade à cooperação Brasil – África que vem sendo construída pelo CEA/UFMG desde sua criação, bem como estreitar os laços com editoras africanas.
A Ku Si Mon Editora foi criada em Bissau em 1994, tendo como uma das suas principais aspirações “dar a conhecer a África através de uma melhor comunicação com os outros e um maior respeito pela pessoa humana em todas as suas diferenças”.
A parceria entre a Coleção Estudos Africanos do CEA-UFMG e a Ku Si Mon Editora da Guiné-Bissau, baseada em interesses e objectivos comuns, pretende atuar para ampliar a circulação da produção acadêmica sobre os estudos africanos, tanto nos países africanos quanto no Brasil e em outros lugares do mundo.
A obra de Wellington Marçal é o quarto título da Coleção Estudos Africanos do CEA-UFMG e o primeiro em parceria com a Editora Kusimon da Guiné-Bissau.
Vanicléia Silva Santos
Universidade Federal de Minas Gerais
Abdulai Sila
Escritor e Diretor da Ku Si Mon Editora
PREFÁCIO
DE RASTROS E RESTOLHOS DA MEMÓRIA: a composição de “lugares de memória” pela literatura
Maria Nazareth Soares Fonseca1
“…como as conchas na praia quando o mar se retira da memória viva.”
Pierre Nora
O livro de Wellington Marçal de Carvalho disponibiliza aos leitores os resultados alcançados por ele a partir da investigação cuidadosa e profunda de narrativas produzidas por dois grandes escritores da Guiné-Bissau: Odete Semedo e Abdulai Sila. Os textos dos escritores, explorados nas diferentes partes que compõem o livro, permitem perceber uma intenção de análise que explora os modos como a memória, em suas várias feições, está presente nos textos selecionados. As discussões produzidas pelo autor exploram ainda a possibilidade de os textos dos escritores Odete Semedo e Abdulai Sila, pelas características que apresentam com relação à memória, poderem ser discutidos à luz das reflexões do historiador francês, Pierre Nora, sobre os “lugares de memória”. O conceito de Nora refere-se a lugares onde a memória “se cristaliza e se refugia”, tentando compreender os sentidos produzidos por locais em que a memória2 “havia eletivamente encarnado” (NORA, 1993, p. 7).
A discussão ampla encaminhada pelo historiador sobre os “lugares de memória” possibilita pensar, como faz Wellington Marçal de Carvalho, no trabalho de muitos escritores e escritoras oriundos de espaços devassados pela colonização tardia que os reprimiu até a década de 1970, no continente africano. Tais escritores, como guardiães da memória, cuidam de trazer para o texto escrito a força da palavra viva, valendo-se,
sobretudo, de estratégias de construção literária altamente criativas.
A partir desse ponto de vista, o livro ressalta singularidades do processo narrativo de Odete Semedo e Abdulai Sila, destacando, sobretudo, as diferentes estratégias que encenam, no corpo dos textos, questões relacionadas à identidade e à memória, elementos importantes à concretização da guineidade.
Com a preocupação de acompanhar os percursos da memória, nos contos de Odete Semedo, as discussões do livro abordam os modos como a escrita da escritora e pesquisadora costura, com precisão, os gestos e a voz da tradição com a letra, artifício com que se grafam os signos da modernidade. Atento a esses arranjos, o autor convida os leitores a perceberem as estratégias utilizadas na composição das ações narrativas que permeiam as passadas apresentadas pelos livros Sonéá e Djênia, ambos publicados no ano 2000. Com contos desses livros, o autor se envereda pelos percursos da memória e pelas feições peculiares com que o tema se apresenta na obra da escritora. Vasculha os contos dos dois livros, detendo-se mais demoradamente em algumas estórias, passadas, como a escritora os prefere nomear.
Ao debruçar-se sobre o conto “Os dois amigos”, o livro destaca o fato de a escritora, valendo-se do gênero conto, recuperar uma estória da oratura guineense, termo preferido pela própria Odete Semedo para “designar todos os textos da tradição oral, recolhidos e fixados pela escrita: contos, cantigas, provérbios, entre outros” (SEMEDO, 2010, p. 79). Deve-se considerar que, ao migrar para o campo da escrita, a estória conserva muitas das características dos textos que circulam nos espaços de tradição oral, como o sentido lúdico com que se veste uma intenção educativa, assumida nos rituais da contação pelos contadores que repassam à comunidade de ouvintes os preceitos que asseguram a convivência em grupo.
Não por acaso, as considerações sobre a estória (re)contada por Semedo sublinham os valores encaminhados pelo conto “Os dois amigos”: a amizade, a obediência aos mais velhos e a sacralidade da palavra. Também fica reiterada a intenção do conto de condenar as atitudes que desequilibram a coletividade, como a ganância, a esperteza e a desobediência que transparecem na história dos dois rapazes. O gesto escritural
de Semedo percorre os caminhos que atravessam os espaços de tradição oral, porque, como ela mesma afirma, “a tradição oral foi, e ainda hoje é, sobretudo na zona rural, um meio de preservar e de transmitir a memória coletiva”(SEMEDO, 2010, p. 80).
Carvalho escolhe denominar de “escrita oralizada” o gesto de Semedo, exposto nos contos dos livros Sonéá e Djênia, percebendo-o através de sentidos produzidos pelos “lugares de memória”, referidos por Pierre Nora como ancoragem de “sinais de reconhecimento e de pertencimento de grupos”(NORA, 1993, p. 13), sentidos que, conforme acentua o historiador, não apagam os conflitos que esses lugares atualizam em sua própria edificação.
As sábias considerações feitas sobre o conto “Aconteceu em Gã-Biafada”, reiteram os elementos que indicam a ligação com os territórios da tradição oral, de locais onde transitam, ainda que misturadas a tradições outras, as estórias orais. São salientadas estratégias narrativas como o recurso do encaixe que viabiliza uma sólida costura de “estórias a partir de estórias” (CARVALHO, 2017, p. 60), para tecer possibilidades de articulação entre memória oral, memória coletiva e o modo como a literatura as recebe na montagem de seus cenários. Reconta-se uma estória da tradição, mas nela se articulam mecanismos críticos que permitem a reconfiguração dos fatos contados e mesmo a subversão do esperado. Metaforicamente, a tradição integra-se às demandas da literatura para conseguir expressar os ajustes motivados pela “mudança das relações do grupo com o seu lugar” (HALBWACHS, 2006, p. 160).
Nas reflexões produzidas sobre o conto “Sonéá”, do livro de mesmo nome, Carvalho considera, sobretudo, os trânsitos da personagem pelos espaços da tabanca e da prasa, (o mundo rural e o urbano) e os conflitos decorrentes de uma postura ainda “dividida em dois”. Mesmo sentindo-se integrada à vida da cidade e ao desempenho de profissão significada pelo mundo da escrita, Sonéá não se ausenta das cerimônias da tradição, obedecendo aos passos protocolares do funeral do Tio Kilin, seguido pelos habitantes da tabanca. As reflexões sobre as estratégias narrativas conclamadas para contar os conflitos vividos por Sonéá nascem da observação de diferentes formas de negociação que transitam
pelo funeral do velho Kilin. O funeral, na cena textual, torna-se palco onde se encenam as feições do mosaico cultural característico do país, exibindo, em uma mesma cena, “cerimônias típicas de raiz africana” (SEMEDO, 2010, p. 200) e orações do padre católico que atende ao pedido do próprio Tio Kilin de ter junto dele, quando morresse, um padre para encomendar a sua alma ao Nhôr Deus.
No conto, as imbricações entre tradição e modernidade são vistas a partir de um gesto escritural que luta contra a morte de rituais da tradição para impedir seu total desaparecimento, ao mesmo tempo que o transporta para o espaço da escrita. Pode-se dizer que é valendo-se de símbolos da modernidade, como a escrita, que a escritora, que é também pesquisadora de manifestações da tradição guineense3 , traz para os cenários do conto Sonéá tanto os rituais “de raiz africana”, quanto as cerimônias levadas ao país pela igreja católica.
Nesse sentido, é importante destacar que, ao se analisar as diferentes roupagens com que a memória se veste, o livro salienta as mudanças sócio-territoriais que alteram os cenários da tradição em locais que se modernizam, embora tentando frear a vertigem de transformações que podem devorar, com a velocidade característica dos novos tempos, rituais da tradição que fortalecem feições identitárias. Os contatos culturais e as ressonâncias que provocam no seio de comunidades que têm ainda hoje um vasto capital simbólico de tradição oral são, por isso, cuidadosamente observados por Carvalho, quando analisa os modos como, nos contos de Semedo, estão disseminados os diálogos entre os costumes da tabanca e os da prasa, em diferentes percepções.
Se nos contos destacados até aqui, a tradição ancestral se mostra nos cenários produzidos pelas narrativas, em outros contos da mesma autora, a saber, “Naquela noite” e “Kunfentu stória da boa nova”, que são discutidos em outra parte do livro, quando se procura apreender o olhar marcadamente crítico sobre os novos tempos. Os males dos novos tempos estão metonimicamente indicados pela alusão a problemas de
3 - Odete Semedo, em sua tese de Doutorado, As Mandjuandadi.Cantigas de mulheres na Guiné-Bissau: da tradição à literatura, defendida na PUC Minas em 2010, analisa a tradição das cantigas de mulher na Guiné-Bissau.
ordem pessoal como a insônia, situação discutida no conto “Naquela noite”, ou ao bom uso da bota, o voto com que será escolhido o novo régulo de uma comunidade imaginada, encenada no conto “Kunfentu stória da boa nova”.
A insônia, em seus sentidos metonímicos, mostra-se como um mal que precisa ser diagnosticado como sintoma do esquecimento que enfraquece o desejo de lembrar e a intenção de restaurar hábitos comuns que, por isso, vão sendo esquecidos. Como peças de um mesmo cenário, o voto e a democracia, no conto “Kunfentu stória da boa nova”, tornam-se elementos importantes para se entenderem questões próprias ligadas ao processo de construção da nação.
Não por acaso, no conto em referência, uma acalorada discussão entre dois jovens sobre os valores da democracia é acompanhada por duas mulheres mais velhas que retomam, da discussão dos jovens, pontos referentes ao uso do voto. Através do recurso de interposição de cenas em que se mostram diferentes atores sociais, o conto dissemina pontos de vista críticos sobre a modernização da sociedade guineense. Tal processo é ressaltado por Carvalho (p. 174 e seguintes), referindo-se à escolha do termo “kunfentu”, do crioulo guineense, que tem sentidos equivalentes a “vento frio, ventania” que atravessa as várias cenas, reforçando as pontuações críticas muito claras no conto. Assim, uma manifestação da natureza tomada, no conto, em sentido crítico, pode ser vista como manifestação concreta de formas de resistência que as narrativas de Semedo conseguem disseminar, a partir de referências ao mosaico plural que constitui o seu país e com o intuito de reforçar o desenho identitário da nação guineense e, mais que isso, de expressar o desejo de que a nação lute pela preservação de sua memória.
O livro permite que se considere o fato de os contos de Semedo trilharem o caminho da resistência, reafirmando a importância da tradição, sem se fixar nela. Não por acaso, como o livro afirma, as tradições, que fazem parte do esforço identitário do país, ressignificam-se, atualizam-se, mostram-se em rostos diferentes. É nesse sentido que o livro considera que Sonéá e Djênia assumem significados que bordejam os “lugares de memória”, vistos por Nora como lugares “atravessados de dimensões
múltiplas”, como a historiográfica, a etnográfica, a psicológica, a política e a literária (NORA, 1984).
Assim, como se vem destacando neste prefácio, os livros de contos de Semedo, ao resgatarem as tradições de contar que remetem à oratura, formatam uma arte de contar que é acolhida pela literatura, sobretudo reforçando um olhar crítico sobre as imposições trazidas pelos atores de um processo articulado por jogos de poder. A intenção, como se afirma no livro, talvez seja a de restaurar o sabor das coisas, lutando para delinear “uma espacialização da memória” (p. 157), que possa acolher suas ressignificações. Esse propósito, certamente, estaria mais próximo da reflexão de Pierre Nora sobre os “lugares de memória”, sobretudo se se considerarem os sentidos impressos, no conceito, sobre a memória nacional.
Pode-se afirmar que os contos de Odete Semedo são focalizados pelo autor do livro com rara acuidade, explorando, com rigor, estratégias e recursos que abordam as feições da memória espontânea, da memória coletiva e mesmo se valendo da memória de experiências vividas pela escritora, como pesquisadora e como guineense, as narrativas de Abdulai Sila, segundo as propostas do autor, abrem-se a outros caminhos que também propiciam a discussão de elementos de processos configurados pelo lembrar e pelo esquecer. Não por acaso, o livro procura ressaltar, em partes da obra do escritor guineense, os diversos movimentos construídos por uma escrita que se caracteriza, na visão de Carvalho, como arte de costurar fragmentos de memórias com os quais é elaborada sua criação ficcional.
Com a motivação dada pela metáfora do “roubo da memória”, o livro discute a encenação da luta contra esse tipo de furto, da qual faz parte a “cafrealização”4 do gênero romanesco, porque se transforma em campo propício à emergência de lugares subalternos e da figura do rejeitados e, sobretudo, colocando “em xeque a força homogeneizadora, tanto do projeto de colonização quanto do que intenta criar a nação
4 - O termo é adotado no livro a partir dos sentidos propostos por Fonseca (2010, p. 80) para aludir a processos de escrita literária que, em contexto de afirmação política, assumiram/assumem tensionamentos da linguagem literária, sobretudo se valendo de recursos próprios de línguas locais orais.
independente, já que ambos teimam em desdenhar as raízes vivas da experiência, e solapar as memórias desse tecido social (CARVALHO, 2016, p. 93). Com essa intenção, a arte de criar de Sila desmonta hierarquias, procurando compor tramas sensíveis, capazes de enfrentar o aniquilamento da memória e o impulso ao esquecimento. Nessa direção, como propõe o livro, se inscreveria o projeto literário de Abdulai Sila, em que dados da tradição misturam-se a demandas da modernidade, sempre em tensão, por vezes deixando aflorar um certo desalento e, por vezes, muita desilusão.
Para discutir os processos de construção narrativa do escritor, que viabilizam propostas de sua literatura de recuperar o acervo simbólico da nação guineense e feições de sua alteridade, como afirma Moema Augel (2010, p. 50), o livro se volta, em um primeiro momento, a cenas dos primeiros volumes da trilogia Mistida, selecionando os volumes: Eterna paixão (1994), A última tragédia (1995), explorando as passagens selecionadas, nesses dois volumes, até à exaustão. Sempre interessado em apontar como se encenam, nos romances de Sila, as diferentes configurações da memória e os processos de lembrar e esquecer, o autor dirige o foco das análises para apreensão de detalhes dos espaços subalternizados, nos quais procura escutar “a voz do qualquer um” e apreender as feições “do rosto humano qualquer” (CARVALHO, 2016, p. 120). Navegando pelas águas de diferentes tempos que emergem nas cenas analisadas dos dois livros, são destacados os fragmentos de memória, catados pelo escritor, para resistir ao projeto de soterramento e aos mecanismos de assujeitamento e alienação impostos ao povo guineense (CARVALHO, 2016, p. 132).
Em outro momento, o livro se detém a examinar partes do livro Mistida, publicado em 1997, poucos meses antes da guerra civil que durou 11 meses, mais concretamente entre 1998 e 1999, na Guiné-Bissau. Posteriormente, o volume foi integrado à trilogia de mesmo nome, lançada, em 2002. No mesmo momento do livro, são analisadas passagens do romance Memórias somânticas (2016), último livro de Abdulai Sila. Nos dois momentos em que se denota a preocupação do autor de esmiuçar partes dos livros do escritor guineense, fica ressaltada a intenção de investigar as estratégias utilizadas pelo escritor para, no
âmbito da literatura, enfrentar “a tentativa de roubo praticada contra os guineenses pelos agentes que, em diferentes épocas, exerceram e exercem o poder no país” (CARVALHO, 2016, p. 91).
Em Mistida (1997), a fragmentação transparece como proposta de focalizar cenários da nação guineense, a partir da visão desolada de uma personagem que focaliza a penosa situação em que vive, refletindo sobre os males de um tempo marcado pela desesperança e sensaboria (CARVALHO, 2016, p. 190). Expõem-se através da figura da Mama Sabel, a personagem enfocada na cena selecionada de Mistida, as chagas de um tempo de aflição e sofrimento que impelem às intensas dificuldades vividas por aqueles que estão à margem, atormentados pelos sofrimentos estampados no velho corpo da mulher. Circulam pela cena do romance, visões brotadas em lugares diferenciados. A jovem, que contracena com a velha, tem olhos mais realistas sobre o mundo que se descortina à sua frente. Um tempo de distopia em que a velha Sabel “não via nenhuma alternativa e nem sentia-se motivada a agir de outra forma” (CARVALHO, 2016, p. 191). A velha, todavia, insiste em retomar cacos de antigas lembranças que a sustentam, mas que são frágeis como possibilidade de esperança. O livro explora, nesse sentido, as conotações de esperança que se ajustam em volta do fraco fogo do candeeiro, cuja responsabilidade de manutenção era partilhada pelas duas mulheres. Acender o fogo como quem acende a vida, soprando nela a rara esperança que a luz poderia significar.
Como um incansável trapeiro, o escritor, na cena escolhida por Carvalho, recolhe os trapos de memória e, metaforicamente, luta contra o roubo de memória (e também de esperança) que parece querer se impor nos domínios enfocados. O estilhaçamento, a fragmentação fazem-se possibilidade de reaver os traços de uma memória confiscada, para inscrevê-la em novos registros. Decorre desse projeto de resistência a insistência em fomentar a escrita literária com elementos indicadores da luta contra o esquecimento.
O livro Memórias somânticas (2016) é visitado pelas reflexões propostas pelo livro de Carvalho como possibilidade de abordagem dos sentidos de “lugares de memória”, propostos por Pierre Nora como estratégia
para se pensar no esquecimento da memória nacional francesa e, particularmente, no modo como a memória vem sendo transformada em potencial de celebração, nos novos tempos. As considerações de Carvalho bordejam esse conflito, tomando como referência uma percepção da memória coletiva a partir de um ponto de vista particular. O interesse por vidas desamparadas parece se acercar da certeza defendida pela personagem de Memórias somânticas, presa a uma esfarrapada cadeira de rodas: “em um mundo desencantado, narrar, reelaborar fragmentos de memórias, reespacializar as memórias, parece ser a única forma de não perder o controle sobre si mesma” (CARVALHO, 2006, p. 159).
A observação perspicaz sobre quem narra a história e sobre o lugar de enunciação dessa história de vida e principalmente sobre os sentidos da “epopeia do resgate” como uma possível ancoragem de “restolhos da memória viva”, empreendida pela personagem, permite enfrentar a melancolia e a desesperança, quem sabe buscando, como afirma o próprio Abdulai Sila, em nota aposta ao livro: recolher os retalhos para montar “a tal ‘colcha de retalhos da realidade’ [poderia possibilitar que] ‘os lugares de memória não se transformem em obscenos ‘monumentos a um fracasso’” (SILA, apud CARVALHO, 2016, p. 164).
Pelo que foi afirmado, neste prefácio, fica clara a intenção do livro de divulgar as discussões nascidas do contato com os contos de Odete Semedo e os romances de Abdulai Sila, de que se salientaram partes específicas, que ajudaram sublinhar aspectos de projetos literários, nos quais o político se integra a pressupostos estéticos que fomentam o processo narrativo dos dois escritores guineense. Nos vários textos discutidos, percebe-se a adesão a uma cultura de “contar e cantar histórias que corre na veia africana em geral e na guineense em particular”, (SEMEDO, 2000, p. 19), mesmo diante das vicissitudes enfrentadas pelo país de que provêm os escritores.
Finalmente, o livro nos incita a perceber, na obra dos dois escritores guineenses, elementos “balizadores de resistência e insumos de sobrevivência para atravessar a dureza dos tempos atuais da Guiné-Bissau” (CARVALHO, 2016, p. 204), permitindo a percepção de processos literários que, imageticamente, abordam a construção do nacional. Na avaliação
do processo literário dos dois escritores, fica, portanto, salientada a decisão de voltar-se aos “rastros e vestígios dos que a história oficial considerava como infra-humanos”, procurando criar novas engrenagens de apreensão da realidade, sem se desfazer dos rastros poéticos inscritos nessa mesma realidade, como, aliás, afirma Carvalho, procurando seguir caminhos apontados por Rancière (2009), que podem persistir nos “lugares de memória”, metaforicamente construídos pelo livro de Carvalho.
Referências
CARVALHO, Wellington Marçal de. A relevante tarefa de forjar a guineidade: a prosa de Odete Semedo e Abdulai Sila. Belo Horizonte, 2017.
FONSECA, Maria Nazareth Soares. Literatura e “arquivos da memória” negociações e dispersão de sentidos. IN: SECCO, Carmen Tindó; SALGADO, Maria Teresa. África, escritas literárias. Rio de Janeiro/ Luanda: Editora UFRJ/UEA. 2010, p. 77 - 84.
HALBWACHS, M. A memória coletiva. Trad. Beatriz Sidou. São Paulo: Centauro, 2006.
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História, São Paulo, 1993, n.10, p. 7-28.
SEMEDO, O. C. As Mandjuandadi.Cantigas de mulheres na Guiné-Bissau: da tradição à literatura. Belo Horizonte, 2010.
RANCIÈRE, J. A partilha do sensível: estética e política. Trad. Mônica Costa Netto, 2. Ed. São Paulo: 4 Letras, 2009.
ABSTRACT
This book general goal is to propose a reflection on the memory and the places of memory symbolically built in prose text from Guinean writers Odete Semedo and Abdulai Sila. It is intended to discuss about how texts architected by writers originated from a culture whose orality is still very strong and present in all social life spheres take effect. Reflection is pursued even on how the “places of memory” concept (originally managed on the History field, and later, disseminated to Geography and Sociology) could be appropriated by literary studies as a theoretical operator on narrative of memories discussion. Such concept allows even to think about the configurations of memory-keeper physical places staged on literary texts from selected Guinean writers and about their meaning on fictional spaces as well as to highlight the narrative strategies used by Odete Semedo and Abdulai Sila to create texts who are built appealing to orality modulations and to aspects from Guinean past history. The emphasized elements on the writers work allows to evaluate the memory function on scheme of aesthetically politicized designs that actuate Guineanity literary features.
Keywords: Guinean Literature - criticism and interpretation; Memory; Places of memory; Nation.
PALAVRAS-CHAVE
Cap 1: Identidade; Estética diaspórica; Yinka Shonibare MBE; Sistema literário; Guiné-Bissau - História
Cap 2: Literatura oralizada; Odete Semedo; Memória; Soneá; Djênia
Cap 3: Narrador trapeiro; Walter Benjamin; Eterna paixão; A última tragédia; Cafrealização romanesca
Cap 4: Lugares de memória; nação; Amílcar Cabral; Farrapo humano
Cap 5: Africa Africans - exposição; Guineidade; Transgressão literária; Partilha do sensível; Revolução estética
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 – CONCHAS VAZIAS NA AREIA DA PRAIA:
A PALApalaVra forte do QualQuer UM .....................................35
CAPÍTULO 2 – AS MEMÓRIAS ORALESCRITAS: O TRANÇA-TRANÇA DE ODETE SEMEDO.....................................................69
CAPÍTULO 3 – AS MEMÓRIAS TRAPEIRAS: VISITAÇÕES AO POÇO DO ESQUECIMENTO DE ABDULAI SILA.....................133
CAPÍTULO 4 – O DECIFRAMENTO DO QUE AINDA SOMOS E DO QUE NÃO SOMOS MAIS: LUGARES DE MEMÓRIA E SENTIMENTO DE GUINEIDADE...............................................197
CAPÍTULO 5 – AS REDES DE SOBREVIVÊNCIA DA MEMÓRIA E O DESENHO DAS ILUSÕES DE ETERNIDADE.....................265
REFERÊNCIAS..............................................................................273
ANEXO 1.........................................................................................285
Entrevista com Abdulai Sila, concedida a Wellington Marçal de Carvalho e Maria Nazareth Soares Fonseca, em Belo Horizonte, Minas Gerais, nos dias 8 e 9 de novembro de 2016, durante a IV Jornada do Centro de Estudos Africanos da UFMG .................................................................................285
ANEXO 2.........................................................................................303
Entrevista com Odete Semedo, concedida a Wellington Marçal de Carvalho, em Cacheu, Guiné-Bissau, em 22 de março de 2017, durante missão de prospecção do Centro de Estudos Africanos da UFMG............................303
ÍNDICE REMISSIVO....................................................................317
SOBRE O AUTOR..........................................................................323
CAPÍTULO 1
CONCHAS VAZIAS NA AREIA
DA PRAIA: A PALApalaVra forte do QUALualQuer UM
“Busco ficcionar a História, reinventando-a, reelaborando-a, com recurso permanente à memória. Aliás, considero mesmo que escrever pressupõe um exercício permanente de memória. Sem História nem memória não se faz a travessia do tempo.”
(CARDOSO, 2004, p. 190)
“Bissau é um enigma Guiné um mistério”
(SEMEDO, 2007, p. 54)
“É preciso encontrar uma saída. Por isso e para isso ele tinha tomado uma decisão: tinha que pensar, pensar sempre.”
(SILA, 2006, p. 69)
“Não mais inteiramente a vida, nem mais inteiramente a morte, como as conchas na praia quando o mar se
retira da memória viva.”
(NORA, 1993, p. 13)
Em que ancoragem poderia um agrupamento social agarrar-se para arquitetar seu processo formador de identidade? Que dispositivos funcionariam como estratégias para esse fim? Indubitavelmente, os contributos poderiam originar-se das mais inusitadas fontes. Momentos de ebulição na trajetória dos povos tornam sobremaneira enfáticos laços, de toda ordem, que acabam por estabelecer pontos comunicantes entre indivíduos, em escala crescente, que, salvo melhor juízo, ato contínuo constituir-se-iam, num horizonte de difícil medida, a frágil emergência da ideia de nação. O gesto criativo coleciona peças relevantes para esse ínterim.
Edition Notes
2ª Edição
Contributors
The Physical Object
ID Numbers
Links outside Open Library
Community Reviews (0)
Feedback?August 21, 2019 | Edited by brazilpublishing | Added new cover |
August 21, 2019 | Edited by brazilpublishing | Added new cover |
August 21, 2019 | Edited by brazilpublishing | Edited without comment. |
August 21, 2019 | Edited by brazilpublishing | Edited without comment. |
August 21, 2019 | Created by brazilpublishing | Added new book. |